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Injustiça em Tempo de Crise

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 : Em cinco anos de combate à corrupção, Augusto Tomás é o único antigo ministro condenado e a cumprir pena efectiva de prisão. Recentemente, foi-lhe recusada a liberdade condicional por uma decisão do Tribunal Supremo cuja falta de fundamentação legal revoltou a comunidade jurídica nacional. Esta reacção significa que a paz social foi mais ameaçada pela permanência de Tomás na prisão do que pela possibilidade da sua libertação.

Não quer isto dizer que Tomás seja um santo ou uma figura exemplar: todos se lembram do seu comportamento arrogante e altaneiro enquanto ministro. Mas não é isso que está em causa, porque não compete aos tribunais julgar a arrogância.

Em contrapartida, mantém-se um confrangedor e absoluto silêncio relativamente ao caso de Manuel Vicente. Terminado o período de imunidade constitucional (que na realidade não existia, mas esse é outro tema de que não iremos agora tratar), a justiça nada diz sobre as acusações a Vicente, seja as provenientes de Portugal, por ter corrompido um procurador local, seja as que estão contidas na acusação realizada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) de Angola aos generais Kopelipa e Dino, que na realidade se focavam em Vicente e não nos generais.

Enquanto isto, em Portugal, de forma silenciosa mas sistemática, vão sendo isoladas as participações sociais de Isabel dos Santos, retirando-se-lhes valor e tornando-as puro “lixo financeiro”, de modo a garantir que não constituem uma ameaça à estabilidade da economia portuguesa. Porém, uma das consequências práticas desta abordagem é o esvaziamento de qualquer possibilidade de recuperação de activos que o Estado angolano pudesse ter.

Voltando a Angola, à divulgação quotidiana de apreensões de bens e de activos de supostos malfeitores corruptos não se tem seguido nenhum movimento processual ou clarificação da situação desses bens e activos.

Todos estes factos demonstram que as boas intenções sobre o combate à corrupção redundaram num fiasco mais ou menos intrigante.

De um lado, temos uma PGR que parece incompetente ou comprometida com o passado. Por isso, avança para ficar parada. É inadmissível o que tem acontecido nos casos mencionados.

Do outro lado, temos tribunais em que os juízes escrevem panfletos sob a forma de sentenças em que fustigam a corrupção, mas na realidade se tornam incapazes de fazer caminhar os processos e julgar e condenar ou absolver com celeridade.

Finalmente, não se percebe exactamente o que tem acontecido aos supostos milhões apreendidos. Onde estão? Como têm sido geridos? Qual o benefício que têm trazido à população?

Face a isto, chegou a hora de inquirir o poder. O que está a ser feito para reformar a justiça e torná-la eficaz na construção do Estado de direito?

A PGR e os tribunais parecem ter-se tornado gestores imobiliários, apenas preocupados em fazer listas de prédios apreendidos que depois dividem pelos seus pares sem qualquer controlo, nem fiscalização, nem prestação de contas. De resto, os processos não avançam, as decisões judiciais não convencem a comunidade, e parece que temos mais um poder capturado por interesses obscuros.

A nomeação de um novo ministro da Justiça surpreendeu, e com ela pode ter-se perdido uma oportunidade para realizar a mudança necessária para que a luta contra a corrupção avance com equidade e celeridade. Pelo contrário, o historial do novo ministro, Marcy Lopes, deixa adivinhar que temos pela frente mais um governante conservador e arrogante, e não alguém empenhado na renovação e na reforma da justiça.

A renovação deve ser exigida por toda a comunidade política e jurídica. Em primeiro lugar, é fundamental que haja transparência, seja quanto aos activos apreendidos, seja quanto aos processos instaurados. Sempre respeitando a lei, a presunção de inocência e a privacidade de cada um, devem existir duas listas públicas e acessíveis.

Uma primeira lista que indique os bens e activos apreendidos no âmbito do combate à corrupção e o seu destino. Há muito que defendemos a operacionalização de um organismo de auditoria da gestão e do destino destes activos, para que o mecanismo de apreensão não se transforme num gigantesco instrumento de extorsão.

A segunda lista que contenha todos os processos anticorrupção instaurados contra figuras relevantes do Estado, contendo o ponto da situação a cada momento.

Com estas duas listas abrangentes – a dos activos apreendidos e seu destino e a dos processos instaurados e sua marcha específica –, haveria a transparência necessária para que todos os interessados soubessem o que efectivamente está a acontecer na justiça. Os mistérios acabariam.

Além da transparência, é fundamental alterar a liderança na PGR. Esta entidade tem de se tornar num mecanismo ágil e descomprometido com o poder político, empenhado na instauração do Estado de direito. As suas chefias devem, por isso, provir de estratos não ligados ao poder oligárquico que dominou o país, mas sim com formação técnica adequada e autonomia. A alteração das chefias da PGR, cortando completamente com o histórico desta instituição, é um imperativo para a reforma da justiça. Finalmente, além da transparência e da alteração das chefias da PGR, é obrigatório reformar a composição dos tribunais superiores em Angola, e concretamente a do Tribunal Supremo. O aumento do número de juízes no Tribunal Supremo pode ser defensável, mas terá de acontecer segundo critérios de capacidade técnica, independência e espírito crítico, e não de antiguidade. Deve ser dada prioridade à formação dos juízes segundo modelos que não o português. Em Portugal, a justiça é das instituições do Estado que funcionam pior e tem-se mostrado totalmente incapaz de lidar com os grandes processos de corrupção: o de José Sócrates, (ex-primeiro-ministro) e o de Ricardo Salgado (ex-banqueiro poderoso). Bem mais útil será olhar para a formação de magistrados na África do Sul ou em outros países da África Austral cuja justiça realmente funcione. Insistir na importação de modelos avariados só contribui para o aprofundamento do descrédito institucional.


Article publié le mercredi 12 octobre 2022
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